Um avião cargueiro do consórcio MAIS vai voar cinco dias por semana entre Lisboa e o Funchal. A operação começou na semana passada e aproveita uma oportunidade de negócio, já que o actual transporte por navio é moroso.
Miguel Albuquerque tinha tomado posse como presidente do governo madeirense há menos de quatro meses, quando, em Agosto de 2015, um empresário regional apresentou-se na Quinta Vigia, sede da presidência do executivo, com uma proposta irrecusável: uma ligação aérea diária entre a ilha da Madeira e Lisboa, exclusivamente para carga.
As autoridades madeirenses esfregaram as mãos de felicidade, até porque não teriam qualquer encargo, mas o projecto acabou por não avançar por falta de financiamento privado e tornou-se uma piada contada e recontada no parlamento regional, sempre que Albuquerque lá ia.
Mas na semana passada, o assunto ficou sério, com o voo inaugural de um avião cargueiro a aterrar no Funchal. Foi o início de uma operação diária (com pausa ao domingo e segunda-feira), que vai permitir colocar na Madeira oito toneladas de carga, em cerca de hora e meia, a duração média do voo entre Funchal e Lisboa. Os preços, de acordo com o consórcio Madeira Air Integrated Solutions (MAIS), que está à frente da operação, são competitivos – cerca de um euro por quilo – e vai permitir abastecer o arquipélago de produtos frescos. Por mar, a principal porta de entrada da região, a carga demora uma média de quatro dias a desembarcar na Madeira, o que inviabiliza a importação de produtos mais perecíveis.
A operação, talvez pelo estrondoso fracasso da primeira intenção, que foi conduzida pela FlyMii, foi agora preparada de forma discreta. Longe da imprensa, sem anúncios oficiais, nem assinaturas de protocolos de colaboração.
“Recebemos todo o apoio da parte do governo regional. Temos trabalhado quase em conjunto, mas não há qualquer tipo de subsídio envolvido na operação”, esclarece ao PÚBLICO António Beirão, CEO da ALS Portugal, que em conjunto com a companhia aérea espanhola Swiftair e a empresa logística madeirense Loginsular, forma o MAIS.
As expectativas são elevadas e os principais clientes estão identificados: retalhistas do ramo alimentar e correio normal e urgente. Os voos comerciais regulares que existem para o arquipélago, TAP e EasyJet, estão vocacionados para passageiros, não para carga, por isso o consórcio prevê aumentar a capacidade de transporte nos próximos seis meses, substituíndo o ATR 72-300F por um Boieng 737, com sensivelmente o dobro da capacidade de armazenamento.
“Assim o mercado responda afirmativamente”, perspectiva António Beirão, dizendo que para a operação ser viável o aparelho terá que completar a rotação Lisboa-Funchal-Lisboa com 75% da ocupação.
Os voos partem de Lisboa todas as manhãs (7:00) com o regresso do Funchal a estar agendado para as 14:15. “Queremos criar condições para os empresários avaliarem as condições de produção, dando resposta às necessidades que já estão sinalizadas”, adianta o responsável da ALS Portugal, dizendo que com esta linha serão abertas novas oportunidades, principalmente para as empresas regionais.
Nesta primeira fase, admite António Beirão, os voos para o Funchal deverão superar em muito a procura em relação aos para Lisboa, mas as perspectivas indicam que a curto-prazo esses valores deverão equilibrar.
“Espero que os empresários aproveitem estas condições excepcionais, que é termos um avião cargueiro”, disse aos jornalistas o secretário regional da Agricultura e Pescas, Humberto Vasconcelos, durante uma conferência à chegada do voo inaugural, lembrando que uma indústria em particular, a aquacultura, irá beneficiar desta operação. Neste momento, a produção regional ronda as duas mil toneladas anuais, mas em breve irá subir para as 3,5 mil toneladas de pescada, que rapidamente chegará, ainda fresca, a Lisboa ou a outra capital europeia.
O consórcio, disse António Beirão, está já a encetar contactos com outras companhias, para que a exportação de produtos regionais possa beneficiar de melhores ligações com o resto da Europa.
Em relação aos Açores, a MAIS diz não ser, para já, viável. Tanto, que o governo local teve que socorrer-se de Lisboa para abrir um novo concurso internacional para a concessão do transporte aéreo de carga e correio entre aquele arquipélago e o continente, depois do primeiro procedimento, lançado ainda no tempo de Pedro Passos Coelho, ter ficado deserto.
O Conselho de Ministros decidiu, em Setembro do ano passado, acrescentar um milhão de euros aos 8,4 milhões de euros que o primeiro concurso previa com indemnização compensatória, mas para já não existe notícias de interessados na linha que prevê a triangulação entre Lisboa, Ponta Delgada e Terceira.
MÁRCIO BERENGUER | PÚBLICO